Comentando Tiras – Pombaranga
Mais um Comentando Tiras no ar, em suas inúmeras voltas, em mais ressurreições que o Goku, mas vamos lá! Pra quem não conhece, o Comentando Tiras funciona assim: A turma do Café dá uma olhada em três tiras de um determinado autor e repassa os seus pitacos, com comentários e sugestões.
Hoje a tirinha é do Rodrigo Budrush, do Pombaranga.
Rafael Dourado – Gosto da diagramação, embora “quadradinha”, não causa dúvida sobre a ordem de leitura – e há o cuidado do posicionamento dos balões, que também é totalmente eficiente.
Embora eu particularmente tenha demorado pra entender a escrita errada da pomba, como recurso de humor é muito legal.
Já na arte, tenta aplicar a sombra com alguma transparência e deixá-la menos “dura”, principalmente quando os personagens saem do quadro.
Rodrigo Chaves – Gostei da temática das Hqs. O zoomorfismo para falar do comportamento humano é algo sempre interessante. O trocadilho dos nomes dos personagens “Pombaranga”, “Pombiscaty” e tal me divertiram.
O grande problema das tiras é a intencionalidade. Por exemplo, o texto escrito de forma errada para criar um estilo, mas que não cria um estilo, fica apenas irritante e difícil de ler. Ou o desenho, que é bastante primário. Essas coisas não são “erradas” ou “ruins” em si, mas elas tem que ser feitas intencionalmente e ficar claro para o leitor que o autor optou por uma estética do “tosco”. Espero que essa seja a intenção do autor, mas, ao olhar para os quadrinhos, fico na dúvida: O autor quis trabalhar nessa estética ou bateu de frente em suas limitações? Qualquer que seja a resposta, o autor ainda tem que melhorar (ou piorar) muito.
A mesma questão da intencionalidade se aplica aos roteiros. Não consegui entender se é para ser engraçado, ou se é para a gente ficar com pena da Pombaranga. Pessoas discutindo e brigando pode ser uma coisa muito divertida (acontece muito na turma da Mônica), ou pode ser deprimente (como costuma fazer o Crumb). Mas o autor tem que ter claro para si qual caminho vai pegar.
Enfim, o autor tem que definir mais essas coisas na sua cabeça, para que possa passar o que está pensando através das Hqs.
Digo Freitas – Eu gostei do nome da protagonista e da sua caracterização, mas o artista não se expõe muito bem, como disse o Chaves, não dá para saber se é pra ser tosco mesmo ou se o autor está tentando fazer algo do seu jeito. Acredito que o pior nessa primeira é a cor. O Laerte ultimamente tem feito coisas incríveis com cores totalmente desconexas, talvez seja um caminho a seguir. http://manualdominotauro.blogspot.com.br
Leonardo Maciel – gosto do texto simulando a linguagem coloquial do personagem. Uma pessoa que faz isso muito bem é o já mencionado Crumb, acho que vale a pena você dar uma olhada no trabalho traduzido dele como referência nesse aspecto. O problema desse recurso é que se usado excessivamente pode dificultar a leitura, como acho que ocorre às vezes no seu trabalho. Lembre-se, qualquer dificuldade que você cria pro leitor, se ele tem que ler um texto devagar ou mais de uma vez ele perde o timing da piada e pode não achar graça.
Tenha cuidado em posicionar o personagem que vai falar primeiro à esquerda do quadro, deixando a leitura mais fluida (afinal, nós lemos da esquerda para à direita, pelo menos no ocidente).
Nessa tira em específico, o personagem que fala antes sempre é o pombo com a interrogação na camisa, veja como tanto a leitura quanto o posicionamento dos balões é facilitado quando se inverte a ordem dos personagens.
Rafael Dourado – Tem um aspecto aqui que eu acho importante ressaltar… A impressão, pelo encaminhamento da trama, é que a Pombiscáty (parabéns pelos nomes, estão excelentes) não tem problemas em conseguir “namorados”, diferente da pombaranga, certo? Uma das suposições que faríamos é que é por ela ser mais bonita que a outra… E ao olhar pelo desenho, parecem ser a mesma só com o cabelo diferente. Valeria a pena alterar um pouco mais o layout dela, talvez pra destacar mais…
Digo Freitas – Realmente, a Pombiscáty deveria ter um tratamento melhor de imagem, para ficar uma pomba razoavelmente mais interessante comparada a Pombaranga…
Eu gostei bastante da mudança de ângulo após a Pombicáty voar, ótima sacada. A visão superior sempre indica valorização do que se vê maior sobre o menor, ou seja, a que voa se acha melhor que a outra.
No quadro final o autor perdeu a chance de colocar uma punchline e fazer a historinha toda valer a pena, e não ser só mais um episódio na “vida desgracenta” da pomba protagonista.
Leonardo Maciel – hmmm… não sei se concordo com o Digo sobre a necessidade de haver uma piada. Acho que funciona uma tira que sirva mais para estabelecer o personagem do que fazer rir. O importante é estabelecer o que se quer. Se o site é de humor, essas tiras dramáticas devem ser usadas com parcimônia. O mesmo vale pra uma série dramática que deve usar humor de maneira comedida.
Concordo em fazer o character design dos personagens mais distintos uns dos outros. A Pombiscáty não precisa ser mais bonita, mas deixar ela mais esguia ou mais alta do que a Pombaranga já diferenciaria as duas. Uma dica é colocar seus personagens um do lado do outro e preencher todos de preto. Com um bom design você consegue diferenciar seus personagens apenas pela silhueta. Exagere mais as proporções dos personagens, o personagem gordo deve ser ainda mais gordo, o alto mais alto, o cabeçudo mais cabeçudo e por aí vai. Isso vale para todos que desenham em um estilo cartum.
Gostei do último quadro da personagem de costas, pequena e apenas a silhueta. Bom recurso pra ressaltar a dramaticidade e solidão da cena.
Rafael Dourado – Nesta HQ ficou mais nítido um problema com o desenho das asas simulando braços e depois tendo que voltar a ser asas… Vale a pena rabiscar mais estudos de como os “braços/asas de pombos” se comportariam erguendo pesos ou coisas do tipo.
E quanto ao letreiro no final do último quadrinho, acho que valeria ter separado do quadro.
Digo Freitas – Eu sinceramente não entendi essa tira pelos problemas citados pelo Dourado. A versão dele “fortão” contra a “franguinho” não teve tanta diferença.
Ficou claro também que a forma de contar histórias do autor usa onomatopeias gigantes como bengalas para ocultar um quadro de ação. Não que não funcione, mas talvez preparar melhor o leitor para o que vem em seguida e não jogar mudanças críticas na cena a cada quadro.
Leonardo Maciel – Mesmo que sua intenção seja ter um desenho mais “tosco”, vale a pena estudar algumas coisas. Como o Dourado destacou, como usar as penas como mãos e como as penas se conectam à bunda do personagem. O que mais me incomodou aqui foi o mesmo que o Digo, não há muita diferença entre o personagem bombado antes e depois de estourar. Como já havia dito, o exagero é a palavra de ordem em um desenho cartum.
Desenhe o personagem musculoso mais musculoso e o fraquinho mais fraquinho. Na cena em que ele está prestes a estourar, também seria legal exagerar o quanto a Pombaranga está apertando e o pombo inflando como um balão mesmo.
Outra coisa que me incomodou foi o mesmo que na primeira tira. A personagem que está falando deveria estar à esquerda do quadro. Na primeira linha da página vemos a sombra da Pombaranga chegar pela esquerda no bombado, mas quando ela o abraço ela está à direita. Parece besteira, mas esse tipo de detalhe ajuda a conduzir a direção do olhar do leitor. Veja como ajuda quando inverto a posiçào dos personagens.
Quer participar do Comentando Tiras? Envie o link do seu site de quadrinhos para contato@cafecomhq.com!
Obrigado pela aula, pessoal! Essa tirinha foi só um experimento, desenhei-a por 3 meses e depois parei. Se algum dia eu voltar a me arriscar em algo do gênero, certamente vou levar muitas das dicas de vocês em consideração. Valeu! 🙂